sábado, 18 de maio de 2013

O Moleque Mais Feio Que Eu Já Vi

Todos têm uma impressão dos outros ao seu redor. Boas ou ruins. É impossível ser neutro mesmo em relação a desconhecidos. Sempre temos um adjetivo para qualificar alguém. Todo ser humano é descritível. O jeito mais fácil de fazer isso é taxar pela aparência: alto ou baixo, gordo ou magro, feio ou bonito.
Como todo mundo, faço isso desde que me conheço por gente. Tenho minhas impressões e julgamentos de pessoas que sequer conheço. Pelo menos tenho sensibilidade de guardar só para mim as observações mais pesadas. Tem quem prefira compartilhar sua impressão alheia em rodinhas fechadas, fazendo chacota de um pobre coitado que não faz ideia de que está sendo motivo de piada. Há ainda os casos de ataque direto, mas esse papo de bullying, para mim, já é um assunto dado como morto e encerrado.
O fato é que nenhuma dessas formas de se pensar o outro está livre da ideia de preconceito, que é uma opinião sem reflexão, sem fundamento razoável. 
Claro que algumas adjetivações como “fulana tem cabelo preto” não ofendem ninguém. Mas algumas, também evidentes, como comentar o peso elevado de alguém, acabam sendo ofensivas. É verídico, mas a pessoa certamente é mais do que aquilo que aparenta. Pensamos coisas sobre os outros sem sequer tentarmos conhecê-los melhor. 
Verdade seja dita: muitas vezes não nos interessamos em conhecê-los. Só que você a viu. A imagem da pessoa está marcada na sua cabeça com uma etiqueta específica. Uma definição pela qual não temos controle. 
E vivemos em uma época do politicamente correto. Você tem que falar tudo de forma calculada para não ofender alguém. Mas no final, sempre alguém acaba ofendido. Algumas vezes com razão, mas na maioria acho que só é gente com vontade de se sentir ofendida e aparecer, uma chance de poder escapar da obscuridade em que se encontram.
Falar de beleza então acaba sendo um tabu. Ninguém nunca me convenceu com esse papo de que não existem pessoas feias e que todos são diferentes. Sou realista. Nem mesmo esse lance de beleza relativa me convence. Como naquele ditado popular: quem ama o feio bonito lhe parece.  Pode até ser, o cara pode ser bonito para a mulher dele, mas continuará sendo feio universalmente. Triste, mas verdade
Partindo desse pressuposto, enfim direi de forma simples e direta que me reencontrei com o “moleque mais feio que eu já vi”.
Vamos à história. A primeira vez que vi o tal sujeito foi nos corredores do meu antigo colégio. Quando olhei para ele a primeira e única coisa que pensei a respeito dele foi “Esse é o moleque mais feio que eu já vi”.
O título foi espontâneo. Parando para pensar direito, ele não faz muito sentido. O garoto não podia ser taxado de “moleque” por mim já que ele estava algumas séries acima. Além disso, conheci muitas pessoas mais feias do que ele ao longo da vida. O “moleque mais feio que eu já vi” nem era o mais feio que eu já tinha visto. Entretanto, ele foi o primeiro que me fez pensar isso de alguém. 
Aí quatro anos depois, em meados do ano passado, reencontrei o tal sujeito dentro de um ônibus. Ele continuava do mesmo jeito de sempre. Parecia o Jar Jar Binks, só que em forma humana. Não, ele não é o Ronaldinho Gaúcho.



A diferença é que desta vez ele estava de terno, com uma pasta na mão. Isso em uma região nobre da cidade. Estava ali muito provavelmente a trabalho. Não julgo pelas aparências (mentira), mas duvido que ele estivesse ali, vestido daquela maneira, para vender caixões. Acredito que ele deva ganhar mais do que eu ganhava, ganho ou provavelmente ganharei algum dia na vida. 
O “moleque mais feio que eu já vi” estava ali de novo na minha frente. Derrotou-me naquele momento e nem sabe disso. E isso apenas tocando sua vida para frente, de cabeça erguida, sem um saco de papel para cobri-la. Ele deu um tapa na minha cara (no sentido figurado) por ser babaca, taxando alguém que nem conheço dessa maneira.


 
Continuo não sabendo nada a respeito dele. Mas devo admitir que a primeira coisa que pensei quando o vi de novo foi “Ainda é o moleque mais feio que eu já vi”.

sábado, 4 de maio de 2013

Relapso

Relapso: que, ou aquele que é negligente no cumprimento de suas obrigações; relaxado, displicente.
Nunca fui uma pessoa muito pró-ativa, só que no último ano me superei. Estive relapso demais. Na época, pude sentir claramente uma queda de rendimento nas minhas atividades mundanas. Tornei a pensar nisso ultimamente ao assistir episódios de duas animações: Bakuman e Homem-Aranha.
No anime e mangá Bakuman existe um personagem chamado Nakai. Sei que minha descrição vai parecer cruel, mas ela simplifica. Ele é o típico gordo fracassado: eterno solteirão, sem namorada, 33 anos de idade, nunca foi popular na vida. Por outro lado, ele é um desenhista talentoso de técnica admirável. Apesar disso só conseguia trabalhar como assistente de outros autores. Os mangás eram tudo o que tinha. Seu sonho era ter uma série publicada e arrumar uma namorada. 
Nakai consegue ter um trabalho serializado, mas continua fracassando na vida pessoal, sendo rejeitado pelas mulheres. Seu foco em desenhar diminui. Após o fim de sua série, cansado de tantas rejeições e ligeiramente constrangido pelos foras levados de colegas de trabalho, desiste da vida de mangaka. Vai morar no interior com a mãe. Além disso, começa a comer muito, se tornando obeso. 



Em um episódio da série animada de 1994 do Homem-Aranha, a Madame Teia aparece para dar uns conselhos à la Mestre Yoda para o amigo da vizinhança. Após tomar uma surra de um vilão, ela diz que ele estava distraído porque estava pensando demais nos seus dilemas amorosos. E era verdade: sua amada Mary Jane tinha anunciado que ia se casar com Harry Osbourn, seu melhor amigo.



Em ambos os casos, o rendimento dos personagens caiu. Fizeram suas obrigações porcamente, porque estavam distraídos pensando em mulher. Completamente relapsos. Igual a certa pessoa.
Certamente há outras razões que tornam uma pessoa relapsa. Porém essa mudança de comportamento sempre piora seu desempenho. Afeta sua produtividade. E veja bem: não estou falando de trabalho. Estou falando da vida como um todo. Antes, apesar do meu jeito meio devagar de ser, sempre era capaz de cumprir bem minhas obrigações. Gosto de forçar uma comparação com o futebol do Zidane: lento, mas eficiente. Deixei de ser assim por um tempo porque me deixei levar por um sentimentalismo barato.



Dei-me ao luxo de ficar com a cabeça nas nuvens o tempo todo. Isso me trouxe problemas. Decepcionei certas pessoas. Fui mal interpretado, taxado de desinteressado. Só que não era bem isso. Minha cabeça estava em outro lugar. Outra pessoa.



Esforcei-me pensando em planos, estratégias, situações e improvisos, mas foi tudo em vão. Não obtive resposta nem reconhecimento pelas tentativas. Banquei o homem modernoesperando pacientemente na fila pela minha vez. Só que ela nunca chegou.



Caso eu esteja sendo nesse momento conselheiro de alguma alma perdida que está na mesma situação em que estive, aí vai um conselho que ninguém me deu: não se precipite. Não adianta dar valor a quem ainda não é uma realidade para você. Isso só lhe causará angústia e ansiedade. Você vai perder seu tempo. Sofrer à toa. Ela não é a solução dos seus problemas. Enquanto você fica aí sonhando o dia inteiro, ela não está pensando um segundo sequer em você. Sequer é por maldade e você sabe disso.
Um relapso deixa de se cuidar, de se dar valor, de cumprir suas obrigações. Periga esquecer-se de viver sua própria vida. Ainda bem que percebi isso a tempo. Estar apaixonado não é desculpa para se tornar relapso. É preciso continuar vivendo por si mesmo. Entretanto não nego que continuo ingênuo te esperando, mas, por hora, adeus você.